por Jean-Guy Riant
(traduzido por Raul Passos a partir da revista "Rose-Croix" n°248, editada pela Grande Loja de Jurisdição de Língua Francesa da Ordem Rosacruz - AMORC)
“Os problemas impostos pelos
preconceitos raciais refletem em escala humana um problema muito maior e cuja
solução é ainda mais urgente: o das relações entre o homem e as demais espécies
viventes... O respeito que desejamos obter do homem para com seu semelhante é
apenas um caso particular do respeito que ele deveria manifestar para com todas
as formas de vida...”. (Claude
Lévi-Strauss)
A
dificuldade em saber se o animal possui de fato uma consciência é uma questão
tão antiga quanto a própria humanidade. O homem jamais gastou tanta energia e
jamais demonstrou tanta vontade quanto para se soltar de sua hipotética
condição animal e, paradoxalmente, jamais conseguiu se separar daquele que foi
o companheiro de toda a civilização humana. Esse elo ancestral que fascina
pensadores de todos os tipos, sejam eles filósofos, cientistas ou até mesmo
teólogos, legou uma literatura abundante, por vezes milenar, sobre o assunto da
consciência animal, ponto principal que nos preocupa aqui. O animal sofre? Ele
pensa? Pode refletir? Pode sentir emoções? Está consciente da morte – ou de sua morte?
Entre
os povos primitivos – no sentido de “primeiros”, e não de “subdesenvolvidos” –
o animal possui, se não uma alma, ao menos uma mente. É algo inconcebível para
esses povos que o animal não seja um ser pensante. Estes seres misteriosos de
pêlos, penas ou escamas dão prova de tal inteligência e tanto fascinam por suas
aptidões que perturbam o homem em sua natureza mais interior e mais sagrada num
magnífico elo místico por natureza.
Entre
os gregos antigos, essa questão da consciência fascinava e animava os debates
filosóficos, causando até mesmo repercussões sociais. Logo, era necessário
definir o animal para saber quem era o homem, um não podendo existir senão se
comparado com o outro, o que levou certos autores a escrever que “sem os animais, o mundo não seria humano”.
Essa dicotomia profunda entre humanidade e animalidade tem sua fonte naquela
época. Procura-se diferenciar de maneira absoluta o homem da besta, a
civilização da barbárie e a “humanidade” daquilo a que chamaremos de
“animalidade”.
As
regiões monoteístas acentuarão por sua vez essa tendência sacralizando o homem
sem levar em conta por vezes a Criação. Nenhum versículo, a não ser o do Gênese
bíblico (Gn 1, 28), proporcionou tantas desculpas para os comportamentos mais
inumanos para com os animais. Lá está dito de fato que “Deus os abençoou [Adão e Eva] e lhes disse: sede fecundos e
prolíficos, cobri a terra e a dominai; subjugai os peixes no mar, os pássaros
no céu e todos os animais que se movem sobre a terra”. Porém, muitas outras
passagens insistem na sabedoria animal. Nessa concepção de sabedoria, a
inteligência é absoluta: o animal nasce perfeito? Sim, de acordo com os
jesuítas, que inventaram a expressão “de
instinto”, para não dizer que o animal era inteligente, ou – suprema
blasfêmia – consciente. E sim também de acordo com René Descartes, rosacruz
que, querendo devolver ao homem seu justo lugar numa Europa inquietante e
inquisitória, tentou mais uma vez efetuar a comparação, desta vez de ordem
metafísica: o homem é o pensamento, originando a palavra articulada.
Descartes
não compreendia bem o furor contra sua concepção dos “animais-máquinas”, que ele regularmente corrigiu ao longo de suas “objeções”, percebendo a imprecisão que
envolvia sua teoria. Em outras palavras, para ele o animal tinha uma inteligência
corporal e não-reflexiva – isto sob influência da poderosa igreja romana, que
havia desposado a concepção de Aristóteles no nível de uma alma tripartida
(nutritiva, sensitiva, reflexiva). Apenas a nutritiva e a sensitiva animariam
os animais, perfeitos autômatos de Deus. Numa carta datada de 5 de fevereiro de
1649, ele chegou a escrever o seguinte: “Todavia,
ainda que, como uma coisa demonstrada que não saberíamos como provar, haja
pensamentos nas bestas, não creio que se possa demonstrar o contrário, pois o
espírito humano não pode penetrar o coração delas”.
Os
partidários acirrados de Descartes, como Malebranche por exemplo, castraram as
mentalidades ocidentais quanto aos animais ainda mais do que o fez a própria
filosofia, pois seus defensores irão ainda mais longe. No furor dogmático do
sagrado que reinava na época, acabar-se-á por afirmar que apenas a alma
reflexiva existe. Consequentemente, os organismos de toda a Natureza são
rebaixados ao plano de autômatos, certamente sutis, mas ainda assim autônomos,
desprovidos de qualquer forma de alma – em outras palavras, de pensamento ou de
mente. Esta concepção redutora, amplamente difundida pela Igreja por razões
teológicas (pois resvalou-se no “Homem-máquina”),
justificará de alguma forma as piores crueldades infligidas ao mundo animal.
Charles
Darwin será o primeiro a de fato lançar a pedra na lagoa ao publicar, no século
XIX, diversas obras nas quais as observações comportamentais que ele fará quanto
aos animais causarão uma reviravolta nas relações que o homem podia ter com o
animal até então. O período industrial rebaixa ainda mais o animal à categoria
de objeto para justificar sua exploração e a vivisseção. Veremos nascer as
primeiras sociedades de defesa dos animais na Inglaterra. Infelizmente, o dogma
lançado por nossa modernidade, não-passível de discussão e ainda tenaz em
nossos dias, permanece: apenas o homem possui uma alma no sentido espiritual ou
psicológico do termo, apenas o homem pensa, apenas o homem é capaz de reflexão,
de altruísmo, de moral, de amor, de sentido de sagrado... Essa breve
recapitulação histórica era necessária para que compreendêssemos um pouco que
fosse da relação tumultuada que o homem sempre manteve com o reino animal.
O
assunto da consciência animal deve ser abordado com extrema prudência,
inicialmente porque é difícil dar uma definição de consciência por si mesma, e
também porque a consciência nos organismos vivos tem essa particularidade de se
encaixar à moda das matrioshkas russas.
Para termos uma imagem concreta disso, os cientistas reconhecem no homem a
existência de um cérebro reptiliano e de um cérebro mamífero. Um será mais
ligado aos instintos e o outro às emoções.
Nesse
contexto, o termo atualmente muito empregado de “animalidade”, pressupostamente
destinado a ser a contraparte do termo “humanidade”, deve ser utilizado com
circunspecção. De fato, isso pode redundar em considerar que a animalidade reúne
em seus extremos todas as formas de vida e de consciência animal e as põe em pé
de igualdade. Nesse caso, coloca-se no mesmo patamar, na escala da consciência,
uma ostra e um chimpanzé... É necessário prudência, pois generalizações não
podem ser feitas. Quanto mais a consciência se refina em suas manifestações,
mais difícil será se esquivar das generalizações, pois se haverá de convergir
insensível e invariavelmente para o conceito de “Indivíduo”.
Assim
sendo, somos mais sensíveis – é fato – aos animais biologicamente mais próximos
a nós. Talvez seja também por essa razão que, quando falamos de animais, o
homem é naturalmente levado, por fenômeno de empatia, a se representar como um
mamífero, assim como um cão, um gato, um cavalo, um elefante ou um leão, e
muito mais raramente como um réptil ou um peixe. Desse modo, e a fim de estabelecer
balizadores para guiar esse estudo, referiremo-nos regularmente ao “animal” no
sentido geral do termo. Contudo, será preciso termos em mente a extrema
multiplicidade de formas que isso pode assumir, pois veremos que certos
animais, por mais simples ou pequenos que sejam, encerram um tanto de surpresas
para uma pessoa de espírito aberto.
A
primeira questão que poderia ser feita é sobre o sofrimento animal e que forma
este sofrimento pode ter. Durante muitíssimo tempo, era costumeiro pensar que o
sofrimento era submetido ao pensamento. O Ocidente, como vimos, tendo recusado
o pensamento ao animal, recusou-lhe também ao mesmo tempo a sua capacidade de
sofrimento. Citávamos Malebranche, e é ele quem manifesta a concepção mais
redutora e a mais desumana. A história relata que um homem se indignou ao ver
Malebranche bater numa cadela grávida e foi interpelá-lo. Malebranche lhe
respondeu que os gritos emitidos pelo animal eram apenas um mecanismo dos
órgãos e do ar e que era absolutamente pueril considerar o sofrimento animal
como um sofrimento real. Como agora sabemos, o sofrimento é conduzido pelo
sistema nervoso e, ainda que o pensamento não esteja totalmente excluído do
processo, ele não desempenha o papel absoluto que se acreditava. Assim, é
preciso que levemos em consideração que todo animal dotado de sistema nervoso é
capaz de sofrer. É impossível negar essa evidência científica. É preciso no
entanto levar em conta igualmente o grau de sofrimento.
Alguns
insetos, como por exemplo o lucano (espécie de escaravelho), munido de
impressionantes defesas, quando em combate com outros machos por vezes têm a
cabeça decapitada: os dois segmentos do animal – a cabeça separada do tronco –
são ainda capazes de viver independentemente um do outro durante mais de uma
semana. Podemos também elencar certos vermes que, cortados em dois, originarão
dois indivíduos; ou ainda a raposa que, pega numa armadilha, não hesitará em
roer sua pata de modo a seccioná-la e se livrar da emboscada... Estas situações,
incríveis do ponto de vista humano, não excluem o sofrimento, mesmo que esses
animais sobrevivam às mutilações.
Mas
qual é fundamentalmente o papel do sofrimento? Ainda que isso pareça paradoxal,
ele protege o corpo orgânico, suporte da vida. É um ferrão que indica o umbral
que não deve ser cruzado para a preservação do corpo físico. E com que
objetivo? Na filosofia rosacruz, a vida em geral e as diferentes formas de
existência em particular acumulam experiências para perfazer a expressão de uma
consciência cada vez mais ampla. Para tanto, é preciso que admitamos uma forma
de memória, e essa memória se produz em ligação com o presente através do
pensamento. Existem memórias rudimentares, outras mais elaboradas, e talvez
mesmo uma forma de memória ou de inteligência mais sutil que poderíamos evocar,
no que se refere ao instinto.
O
pensamento no animal não é mensurável em estrito senso da mesma forma como o é
no humano. Alguns cientistas medem o pensamento em microvolts... Isso porém não
revela informações sobre seu conteúdo. O mesmo ocorre com o animal. Tentar
compreender o animal unicamente segundo os critérios do pensamento humano é um
verdadeiro caminho para aquilo que alguns tanto condenam: a antropomorfização,
ou seja, a projeção dos afetos humanos sobre os animais. Wittgenstein escreveu
a esse respeito: “Se um leão falasse, não
poderíamos compreendê-lo”. Os gregos já refletiam sobre a eventualidade de
o animal formular uma representação do mundo que lhe seja própria. Para essa
representação do mundo, virtual ou abstrata, salientamos, é preciso uma determinada
forma – ainda que elementar – de reflexão.
Ora,
essa faculdade que pensávamos até aqui ser propriedade exclusiva do homem e de
alguns mamíferos superiores está espalhada bastante amplamente pelo mundo
animal. Um dos exemplos mais chocantes é o de um animal que acompanha o homem
há milênios – e não é o cachorro, o gato ou o cavalo, que poderíamos todos
evocar longamente –, mas um que nos acompanha de forma muito mais modesta: a
abelha. Os trabalhos de Frisch, comentados por Sir John Eccles, são a esse
respeito interessantes sob todos os ângulos. Ele não apenas pôs em evidência a
existência de uma linguagem simbólica entre as abelhas, executada com a ajuda
de uma dança que informa as outras abelhas quanto à presença de uma fonte de
alimento, à distância e à direção em que esta se encontra, como também
ressaltou outro fato menos conhecido e que servirá aqui ao nosso propósito: o
enxameamento.
Quando
o enxame é formado e as abelhas buscam um local para abrigar a colônia, várias
delas partem para explorar as cavidades, grotas ou outros endereços suscetíveis
de lhes oferecer um abrigo confortável, próximo às fontes de alimento, em que
haja incidência de sol, umidade e que esteja a salvo dos predadores. Quando as
abelhas regressam, elas executam a famosa dança destinada a informar suas
congêneres. Fato extraordinário é que é preciso uma unanimidade para que o
enxame se desloque e, para tanto, é necessário que as abelhas façam uma
escolha. Para complicar a situação, acontece de algumas delas não estarem de
acordo, cada qual dançando para o endereço que encontrou. Nesse caso, cada
abelha se desloca até o outro local para inspecioná-lo e verificar se ele é
mais acolhedor do que o seu. Algumas vezes ela insiste e outras vezes muda de
ideia. A abelha dá prova de representação, de comunicação simbólica, de
comparação, de reflexão e, por fim, de escolha. Lembremos que a abelha possui
apenas alguns milhares de neurônios, comparados aos bilhões de um cérebro
humano...
Essa
consciência nascente do mundo animal é fácil de se identificar entre os animais
sociais, e ainda mais entre os mamíferos. A vida em sociedade exige que cada
qual encontre seu lugar e isso só pode se fazer evidentemente numa relação com
um novo conceito. Esse tipo de organização é uma mão estendida à consciência
para uma nova progressão no animal, pois ela incita a considerar o outro e a
cooperar com ele para a coesão e a sobrevida da microssociedade estabelecida. Dessa
necessidade nascerá a empatia – a capacidade de se colocar no lugar do outro e
imaginar o que ele sente. Este é o caso, agora reconhecido, dos grandes símios,
dos elefantes, dos golfinhos e muito provavelmente das baleias. Essa empatia
oferece numerosas vantagens à consciência animal, originando muitos exemplos de
altruísmo, o que oferece aos filósofos debates suficientes sobre a moral e a
ética entre os animais. Assim, as leoas tomam conta das mais idosas entre elas,
caçando em seu lugar e chegando até mesmo a pré-mastigar a comida para aquelas
cuja dentição já esteja muito desgastada. Encontramos esse comportamento entre
os cavalos selvagens, entre os elefantes que tomam conta de seus semelhantes
mais fracos ou dos que foram mutilados, e ainda em muitos outros casos...
Esse
tipo de comportamento não oferece portanto nenhuma explicação puramente
evolucionista satisfatória. Na filosofia rosacruz, o altruísmo é um atributo
potencial de certo grau de consciência, que aqui os animais possuem. A empatia
porém oferece também, em estado embrionário, a consciência de si e de se fazer
escolhas. Ora, revela-se que, como dizíamos, esse altruísmo é potencial e só se
desenvolve ao ser solicitado. A capacidade de imaginar aquilo que o outro pode
sentir também possui um lado contrário...
Para
ilustrar isso, citaremos os chimpanzés, que são extremamente hierarquizados. A luta
pelo poder preocupa o conjunto da comunidade, originando coalizões que se
estendem por vezes durante vários anos. O chimpanzé é agitado e por vezes muito
agressivo, sendo capaz de chegar a cometer uma morte premeditada. Assim, Jane Goodall,
primatologista célebre mundialmente, fez nos anos 1980 a seguinte observação,
que ela hesitou em tornar pública, tamanha a perturbação que ela lhe provocou:
Chimpanzés
patrulhavam e velavam ciosamente pelo território de sua colônia. Um dia, um
casal de chimpanzés estranhos à comunidade, tendo penetrado na zona proibida,
foi violentamente agredido. A fêmea conseguiu escapar, refugiando-se no alto de
uma árvore. O macho foi morto sem cerimônias. Esta foi a primeira vez em que o
homem constatou no meio animal uma “deformidade” das especificidades “humanas”:
o assassinato. E para perfazer a situação, atraído pelo ruído do tumulto, o
macho dominante, vendo a fêmea, manifestou-se ruidosamente. Esta, descendo da
árvore, fez o gesto de amizade e de submissão e tentou um abraço de
reconciliação. O macho dominante se afastou violentamente dela e, tomando uma
folha de árvore, raspou precisamente o local em que havia sido tocado pela
fêmea desconhecida... Uma primeira forma de hostilidade? A fêmea porém, após
diversas tentativas, foi finalmente admitida no clã e não foi morta. Quando a
consciência se afina, como no caso dos macacos, a escolha se impõe a nós.
Terminaremos
esse estudo com a consciência da morte entre os animais e o possível nascimento
do sagrado entre eles. Por muito tempo também, e porque o homem honra seus
mortos por meio de rituais fúnebres, pensou-se que o homem era capaz de
perceber essa mudança de estado que é a morte. Mais uma vez a observação atenta
dos animais revelou o contrário. Quais são as razões que levam uma gazela a
fugir de um leão? Seria simplesmente instintivo ou porque ela seria capaz de
pressentir sua morte iminente? De fato, é difícil responder essa pergunta. Foi
observado que, muitas vezes, gazelas se amontoavam, arriscando suas próprias
vidas, parecendo fascinadas em contemplar um leão devorando uma de sua espécie.
Todavia,
a percepção da morte como mudança de estado existe entre muitos animais, e
especificamos mais uma vez que isso não ocorre unicamente entre os mais
evoluídos. As formigas, por exemplo, possuem no formigueiro uma câmara especial
na qual depositam os cadáveres de suas congêneres. Não há cultos observáveis,
mas qual seria portanto o interesse evolutivo de se conservar os cadáveres? Por
que não se livrar deles no exterior do formigueiro? Os elefantes acompanham
seus mortos e conhecem um ritual fúnebre particularmente emocionante. Os
macacos também fazem rituais e cobrem o corpo com galhos. As baleias ajudam até
o último suspiro as suas congêneres no fim da vida e as mantêm na superfície.
Destacamos assim a grande emoção sentida pelos animais sabendo da morte de seu
mestre, indo até a tumba e por vezes mesmo deixando-se morrer também.
Tratamos
até esse momento da morte do outro. Mas poderia o animal ser consciente de sua
própria morte? Para responder essa pergunta seria necessário que penetrássemos
a mente de um animal. Isso é materialmente impossível, contudo através da
linguagem isso poderia ser concebível. No momento, os únicos animais capazes de
se comunicar com o homem por meio de uma linguagem comum, a linguagem americana
de sinais, são os grandes símios. O caso que nos interessa aqui é o de Koko, um
gorila apaixonado por gatos ao qual foi ensinada a linguagem dos sinais. Eis o
que Koko respondeu quando lhe fizeram perguntas sobre a morte:
Pergunta: “Para
onde vão os gorilas quando morrem?”
Koko: – “Confortável
– buraco – adeus”.
P.: “Quando morrem
os gorilas?”
Koko: – “Preocupações
– velhos”.
P.: “Como os
gorilas se sentem quando morrem? Felizes, tristes, amedrontados?”
Koko: – “Dormir”.
Este
não é o único caso espontâneo conhecido que possa deixar presumir a consciência
da morte num animal: é também conhecido agora o do gorila-de-dorso-prateado
Michael, órfão que foi criado com Koko. Perguntado sobre sua mãe, ele evocou a
lembrança que tinha do seu massacre por caçadores na floresta africana quando
era bebê, explicando: “desordem-[para]-carne-gorila, fazer careta-batalha,
gritar-de-dor, tumulto-ruidoso, terror-mágoa-enfrentar-fazendo careta,
cortar-o-pescoço, boca-mãe-[ficar]-aberta”
(tradução aproximada da ASL – Linguagem Americana de Sinais). Relata-se por
outro lado que quando os caçadores africanos penetram uma floresta e se deparam
com uma mãe chimpanzé com seu filhote, caso o homem esteja armado, ela coloca
espontaneamente o pequeno à sua frente: estaria ela consciente do perigo de sua
morte e, caso estivesse, esperaria a compaixão do caçador? Se for este
efetivamente o caso, então as emoções que ela evoca são as mesmas no chimpanzé
e no homem.
Essa
proximidade emocional partilhada com os animais nos conduz irremediavelmente à
questão do sagrado. É bastante extraordinário ver que certos animais, como os
ursos por exemplo, ou os grandes símios, permanecem por horas diante de um
pôr-do-sol ou de uma belíssima paisagem, igualmente hipnotizante para o homem. Esses
animais possuiriam uma noção de estética? Essa contemplação produziria na
consciência animal uma intensa emoção de beleza? Esse breve momento de harmonia
exterior convocaria a harmonia da consciência interior a se manifestar?
Muitos
pontos diferentes foram abordados nesse texto, porém há outros que mereceriam
ser ditos ou salientados. Muitos de nós certamente vivenciamos momentos
intensos com os animais e deles temos compreensões distintas. Cada qual é livre
para formar suas opiniões a esse respeito.
“Olha teu cão nos olhos e não poderás
afirmar que ele não tem alma”.
(Victor Hugo)