
Fierbinti fica a pouco mais de 35 quilometros a nordeste de Bucareste e, ao mesmo tempo, parece estar em outro planeta. Nesta simpatica vila, nosso amigo Fernando erigiu uma simpatica casa de campo, rustica, charmosa e acolhedora. Do andar de cima, onde me instalei, uma gigantesca janela da vista para o Lago Dridu, que tem 12 quilometros de extensao Na parede da escada que da acesso para o andar superior, fotos de antepassados do Fernando e da Elena. Brinquei com ele, dizendo que, como naqueles desenhos animados, elas dao a impressao de que vao mexer os olhos, nos seguindo! Brrr... Coisas da Romenia!



Por vizinhos, temos a simpatica dona Sandina e sua igualmente simpatica gansa de estimacao, a Bujorel! Fomos visita-los no domingo pela manha, e ela estava com a familia colocando uma imensa carroca carregada de uvas para moer e, apos isso, colocar num tonel para fabricacao de vinho. Enquanto Fernando e Elena conversavam animadamente com ela (com a Sandina, nao com a gansa...), dois parentes dela me explicavam o processo de fermentacao da uva. Fiquei estupefato quando percebi que o romeno falado pelos camponeses me soa muito mais claro do que o falado em Bucareste.

Quando ja anoitecia, estavamos a mesa degustando um delicioso feijao (!) feito a maneira romena pela Elena quando tocou o telefone. Ao cabo de alguns instantes, Fernando voltou dizendo: "O Conselheiro Jorge para voce, no telefone". Atendi. O conselheiro me contava sobre uma amiga, professora de ballet no Teatro Nacional da Romenia, que vive sozinha numa casa no centro de Bucareste e que dispunha de um quarto para alugar. O melhor de tudo? Fala frances fluentemente. Nesse momento, visualizamos a possibilidade de me instalar na casa dela, para nao haver a necessidade do deslocamento diario de Fierbinti a Bucareste, conservando nao obstante a possibilidade de ir vez por outra para o vilarejo na casa do Fernando para estudar no piano dele, mais a vontade, e la ficar por uns dias.
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Segunda-feira, 9 da manha. Ja na entrada de Bucareste, um transito digno de Sao Paulo retardava a nossa chegada. Eu, incrivelmente tenso por conta de saber o resultado do exame de admissao, que havia sido na sexta-feira, sentia passar milhares de coisa pela cabeca.
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Perto do meio-dia, cheguei na universidade e encontrei imediatamente o professor Dimulescu, chefe do departamento de piano, pessoa muito prestativa que me havia recebido para o exame e que me havia explicado o funcionamento do mestrado. Quando perguntei sobre o resultado do exame, com o sorriso que habitualmente ele me dispensava disse, em bom frances: "Voce esta admitido. O exame foi apenas para sabermos seu nivel de piano. Desejo grande sorte a voce".
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Nao senti a euforia esperada, mas um alivio sem precedentes. Fui a secretaria onde as sempre gentis e risonhas secretarias, Mariana, Liliana e Georgiana se ocuparam de me ditar as requisicoes que eu deveria fazer (em romeno!) solicitando matricula nas disciplinas de Musica de Camara, Acompanhamento e Piano. Aguardo, por fim, o comeco das aulas, em 1 de Outubro.
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De tarde, cheguei a casa da professora Adina. Surpreendeu-me com sua comunicabilidade e gentileza. Mostrou-me meu quarto e as demais instalacoes. Nao podia ser melhor. Aqui estou muito bem alojado e posso acessar a internet. Estou proximo da universidade e do centro (e do Fernando, havendo emergencia...)


Apenas a noite, ja deitado e tentando ler uma biografia da genial pianista Clara Haskil (em romeno), subitamente me dei conta do fato de ser um mestrando agora, e de como as coisas tem maravilhosamente acontecido...
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Assim vou me despedindo de mais uma pagina dessa rapsodia, direto aqui da Romenia, terra onde nao existem cobradores de onibus, onde as ciganas se vestem com rara beleza, onde as portas abrem sempre pro lado de fora e, nao menos importante, onde os pimentoes sao redondos e as cebolas sao compridas!



por Raul Passos, em Bucareste, Romenia, 23/09/2008